Juiz das garantias: um avanço necessário para o processo penal


O juiz das garantias é um instituto que visa fortalecer o sistema acusatório e a legalidade do processo penal, garantindo a imparcialidade do juiz que irá julgar o processo e os direitos fundamentais da pessoa investigada. O instituto foi introduzido pela Lei n. 13.964/2019, também conhecida como pacote anticrime, e regulamentado pela resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), aprovada em maio de 2024, após um amplo debate com representantes do sistema de justiça e com o aval do Supremo Tribunal Federal (STF), que declarou a sua constitucionalidade em agosto de 2023.

Segundo a resolução do CNJ, o juiz das garantias é responsável por realizar o controle da legalidade da investigação criminal e de salvaguardar os direitos individuais da pessoa investigada, cessando sua competência com o oferecimento da denúncia. A partir daí, o processo é distribuído a outro juiz, que irá analisar a admissibilidade da acusação, conduzir a instrução probatória e proferir a sentença. Dessa forma, evita-se que o juiz que irá julgar o processo tenha contato com provas ou elementos que não sejam admitidos em juízo ou que possam influenciar o seu convencimento.

O juiz das garantias representa um avanço para o modelo de processo penal adotado pela Constituição Federal de 1988, que consagra o princípio do sistema acusatório. Esse princípio implica a separação entre as funções de acusar, defender e julgar, atribuindo a cada um dos sujeitos processuais um papel bem definido e limitado. O Ministério Público é o titular da ação penal pública, cabendo-lhe a iniciativa de denunciar o suposto autor do crime. A defesa técnica é o órgão encarregado de assegurar o contraditório e a ampla defesa do acusado, exercendo o direito de contestar, produzir provas, recorrer e requerer medidas favoráveis ao seu cliente. O juiz é o órgão imparcial e independente que decide o conflito, com base nas provas produzidas pelas partes, sem interferir na investigação ou na instrução probatória.

Além de reforçar a imparcialidade do juiz, o juiz das garantias também contribui para a proteção dos direitos do acusado, pois permite um maior controle sobre a legalidade e a proporcionalidade das medidas cautelares, como prisões, buscas e apreensões, interceptações telefônicas, quebras de sigilo, etc., que são tomadas durante a fase de investigação. O juiz das garantias também assegura o respeito às garantias constitucionais, como o devido processo legal, a presunção de inocência, a ampla defesa e o contraditório, evitando a antecipação de juízos de valor ou de culpabilidade. Além disso, possibilita uma maior isonomia entre as partes, evitando que o Ministério Público tenha uma relação de proximidade ou de confiança com o juiz que irá julgar o processo, o que poderia gerar uma vantagem indevida ou uma quebra da igualdade de armas.

O juiz das garantias, portanto, se insere na lógica do sistema acusatório, ao garantir que o juiz que irá julgar o processo seja um terceiro imparcial, que não tenha participado da fase de investigação ou que tenha sido contaminado por elementos que não sejam relevantes ou válidos para a decisão. O juiz das garantias é um instrumento que pode contribuir para a melhoria do processo penal, mas que depende de uma atuação conjunta e comprometida de todos os operadores do direito, bem como de uma participação cidadã e democrática da sociedade, para que se possa alcançar uma justiça penal mais humana, justa e efetiva.


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