Prisões preventivas no Brasil: uma análise crítica da violação do devido processo legal

 



A prisão preventiva é uma medida cautelar que, segundo o Código de Processo Penal, visa garantir a ordem pública, a conveniência da instrução criminal ou a aplicação da lei penal, quando há indícios suficientes de autoria e materialidade de um crime grave. No entanto, essa medida tem sido usada de forma abusiva e indiscriminada no Brasil, gerando um alto número de encarceramento provisório e violando o princípio da presunção de inocência, que é um dos pilares do Estado Democrático de Direito. Neste artigo, pretendemos fazer uma análise crítica dessa realidade, com base nos dados mais recentes e na obra "As misérias do processo penal", de Francesco Carnelutti, um dos maiores juristas italianos do século XX.

Em primeiro lugar, é preciso ressaltar que a prisão preventiva, como qualquer outra forma de restrição da liberdade, deve ser usada apenas como exceção, quando não há outra medida menos gravosa que possa assegurar os fins do processo. A Constituição Federal de 1988 estabelece que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, ou seja, até que se esgotem todos os recursos possíveis. Portanto, a prisão preventiva não pode ser usada como antecipação de pena ou como forma de coação ou constrangimento do acusado. Essa é a regra geral que decorre do princípio da presunção de inocência, que, segundo Carnelutti, é "a mais importante garantia da liberdade individual contra os abusos do poder" (CARNELUTTI, 2008, p. 21).

Em segundo lugar, é preciso reconhecer que, na prática, a prisão preventiva tem sido aplicada como regra, sem a devida fundamentação e sem a observância dos requisitos legais. Segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), em junho de 2020, havia 253.963 presos provisórios no Brasil, o que representa 31,7% da população carcerária total. Esse número revela um cenário de violação sistemática dos direitos e garantias fundamentais dos acusados, que ficam submetidos a condições precárias e desumanas nas prisões, sem terem o direito de se defenderem adequadamente. Além disso, muitos desses presos provisórios acabam sendo absolvidos ou recebendo penas menores do que o tempo que já cumpriram, o que demonstra a injustiça e a ineficácia dessa medida. Como afirma Carnelutti, "a prisão preventiva é a mais grave das misérias do processo penal, porque é a mais injusta e a mais inútil" (CARNELUTTI, 2008, p. 23).

Em terceiro lugar, é preciso que se respeitem as regras do jogo no processo penal, que visam garantir um julgamento justo e imparcial. A prisão preventiva deve ser usada com parcimônia e proporcionalidade, somente quando houver elementos concretos que justifiquem a sua necessidade e adequação. Do contrário, estaremos diante de uma grave violação do devido processo legal, que compromete a dignidade da pessoa humana e a democracia. Como alerta Carnelutti, "o processo penal não é um jogo, mas uma luta, na qual o Estado, armado até os dentes, enfrenta o cidadão, desarmado e indefeso" (CARNELUTTI, 2008, p. 25). Por isso, é preciso que haja limites e garantias para o exercício do poder punitivo, que não pode se transformar em uma forma de opressão e violência.

Em conclusão, podemos afirmar que as prisões preventivas no Brasil são uma realidade preocupante, que demanda uma urgente revisão e reforma. A aplicação indiscriminada e abusiva dessa medida viola o princípio da presunção de inocência, que é uma das mais importantes garantias da liberdade individual contra os abusos do poder. Além disso, a prisão preventiva é uma medida injusta e inútil, que não contribui para a efetividade da justiça penal, mas apenas para o aumento da população carcerária e da violação dos direitos humanos. Por fim, a prisão preventiva é uma medida que fere as regras do jogo no processo penal, que visam garantir um julgamento justo e imparcial. Por isso, é preciso que se respeite o devido processo legal, que é a condição essencial para a dignidade da pessoa humana e a democracia.

 

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